segunda-feira, 27 de junho de 2022

Pela "Teoria do Desvio Produtivo" a desnecessária perda de tempo útil imposta pelo fornecedor para o reconhecimento do direito do consumidor configura abusividade e enseja indenização por danos morais.

 


Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Superior Tribunal de Justiça vem acolhendo a “Teoria do Desvio Produtivo” como tese em respeito ao tempo do consumidor

Segundo a teoria do desvio produtivo, a desnecessária perda de tempo útil imposta pelo fornecedor para o reconhecimento do direito do consumidor configura abusividade e enseja indenização por danos morais.

 Confira trecho da ementa do acórdão 1338974, 07623639820198070016, Relator: CARLOS ALBERTO MARTINS FILHO, Terceira Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, data de julgamento: 12/5/2021, publicado no PJe: 17/5/2021, verbis:

"(...) 6. A tentativa frustrada de solucionar a controvérsia extrajudicialmente (protocolos de atendimento e reclamação na ANATEL), a fim de conseguir utilizar regularmente a linha, revela desídia da empresa ré e procrastinação na solução do problema sem razão aparente, o que causa extremo desgaste ao consumidor. 7.  Além disso, o esforço e a desnecessária perda de tempo útil empregado para o reconhecimento dos direitos do demandante, que não obteve fácil solução dos seus reclames na via administrativa (Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor), sendo independente o meio pelo qual foi solicitado a solução do seu problema, pessoalmente, por meio de call center ou via aplicativo, são circunstâncias que extrapolam o limite do mero aborrecimento e atinge a esfera pessoal, motivo pelo qual subsidia reparação por dano moral." (grifo nosso)

O tempo perdido no atendimento precário de agências bancárias

A teoria do desvio produtivo também aplicada no REsp 1.737.412, originada de ação civil pública ajuizada pela Defensoria Pública de Sergipe contra o Banco de Sergipe, para que a instituição financeira cumprisse, entre outras medidas, as regras de tempo máximo para atendimento presencial nas agências.

Em primeiro grau, o juiz condenou o banco a disponibilizar pessoal suficiente para o atendimento nos caixas, a fim de que fosse possível respeitar o tempo máximo na fila de atendimento. O magistrado também condenou a instituição ao pagamento de danos morais coletivos de R$ 200 mil, mas o Tribunal de Justiça de Sergipe afastou a compensação pelos prejuízos extrapatrimoniais.

Nancy Andrighi explicou que o dano moral coletivo se diferencia do dano individual – que busca, primordialmente, a restauração ao status quo anterior ao prejuízo da vítima – e tem o objetivo de sancionar o responsável pela lesão, inibindo assim a prática ofensiva. Como consequência, apontou, ocorre a redistribuição do lucro obtido de forma ilegítima por aquele que ofendeu a sociedade.

Segundo a ministra, um dos principais propósitos do sistema capitalista – concebido como um sistema de produção de bens e de prestação de serviços baseado na eficiência e na especialização – é gerar o máximo de aproveitamento possível dos recursos produtivos disponíveis.

Citando a doutrina de Marcos Dessaune, Nancy Andrighi comentou que, na sociedade pós-industrial, o consumo de um produto ou serviço de qualidade, produzido por um fornecedor especializado na atividade, tem a utilidade subjacente de tornar disponíveis o tempo e as competências que o consumidor precisaria para produzi-lo para o seu próprio uso.

Dessa análise, de acordo com a relatora, extrai-se uma espécie de função social da atividade dos fornecedores, relacionada à otimização e ao máximo aproveitamento dos recursos produtivos disponíveis na sociedade – entre eles, o tempo.

O tempo perdido e a otimização do lucro empresarial

Nancy Andrighi reforçou que a proteção à intolerável e injusta perda do tempo útil do consumidor ocorre pelo desrespeito voluntário das garantias legais, com o nítido intuito de otimizar o lucro em prejuízo da qualidade dos serviços – conduta que justifica a condenação por danos morais coletivos.

No caso dos autos, a relatora lembrou que a legislação municipal estabelecia como constrangimento do consumidor tempo de espera superior a 15 minutos em dias normais e 30 minutos em dias especiais, mas o banco impunha aos clientes tempo de espera que ultrapassava duas horas.

"A instituição financeira recorrida optou por não adequar seu serviço a esses padrões de qualidade, impondo à sociedade o desperdício de tempo útil e acarretando violação ao interesse social de máximo aproveitamento dos recursos produtivos", concluiu a ministra ao restabelecer a condenação por danos morais coletivos.

O tempo perdido em longas esperas no caixa eletrônico

Também com base na teoria do desvio produtivo, a Terceira Turma manteve a condenação de dois bancos ao pagamento de danos morais coletivos de R$ 500 mil cada, em razão de falhas em terminais eletrônicos por causa do desabastecimento dos caixas. Na ação, o Ministério Público do Tocantins relatou período de espera superior a 40 minutos para que os consumidores conseguissem utilizar os terminais.

"É imperioso concluir que a inadequada prestação de serviços bancários, caracterizada pela reiterada existência de caixas eletrônicos inoperantes, sobretudo por falta de numerário, e pelo consequente excesso de espera em filas por tempo superior ao estabelecido em legislação municipal, é apta a caracterizar danos morais coletivos", destacou a ministra Nancy Andrighi.

 

Leia também: REsp 1929288  REsp 1737412    REsp 1634851

 

Anderson Siqueira Lourenço


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