quarta-feira, 22 de junho de 2022

AÇÃO DE USUCAPIÃO DEPENDE DE PROCEDIMENTO EXTRAJUDICIAL PRÉVIO?

 


AÇÃO DE USUCAPIÃO DEPENDE DE PROCEDIMENTO EXTRAJUDICIAL PRÉVIO?

 

Não se pode olvidar que o Direito serve para a adaptação social, ordenando a comunidade e viabilizando a convivência. Traça, pois, regras de controle social...

                                                                    Farias e Rosenvald

Preliminarmente, insta consignar que o instituto da usucapião pertence ao Direito Privado, Direito Civil, inserto no Livro III (Do Direito das Coisas), Título III (Da Propriedade), Capítulo II (Da Aquisição da Propriedade Imóvel), Seção I (Da Usucapião) do Código Civil Brasileiro de 200, sendo instrumento/meio para efetivar e transformar a posse em propriedade. 

A posse está regrada no mesmo códex e livro da usucapião, antecedendo o Título II (Dos Direitos Reais), estreia o instituto do Direito das Coisas com o Título I: Da Posse. 

Cumpre enunciar que no Título III (Da Propriedade), a sua aquisição por meio da usucapião (Seção I) antecede a aquisição pelo registro do título (Seção II), destacando e reconhecendo sua grande importância na vida social brasileira.

Contrariamente ao que muitos pensam, o Direito Possessório possui tratamento concorde ao Direito Real, sendo tutelado pela legislação, doutrina e jurisprudência brasileira de forma acurada. 

Apesar de, tanto o direito possessório quanto o direito real orbitarem a esfera patrimonial, ambos são peculiarmente distintos. 

No Direito Reala propriedade se transfere, entre vivos, mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis, ou seja, o proprietário ou seu procurador efetivam a transferência, pessoa para pessoa, após pagar os devidos tributos, taxas, emolumentos, no Cartório de Registro de Imóveis em que a propriedade está registrada. Também existem características próprias: direito de sequela (art. 1.228 do C.C/02); direito de preferência (arts. 961, 1.419 e 1.422 do C.C/02); oponível erga omnes (absolutismo dos direitos reais); obediência a um rol taxativo (numerus clausus) de institutos, previstos em lei, consagrando o princípio da tipicidade dos Direitos Reais (art. 1.225 C.C/02); regência do princípio da publicidade, o que se dá pela entrega da coisa ou tradição (no caso de bens móveis) e pelo registro (no caso de bens imóveis). 

Já no Direito Possessório, pela posse ser o exercício de propriedade, podendo ser transmitida por instrumento particular, cessão de direitos, de forma tácita, ou até mesmo pelo uso por determinado lastro de tempo da propriedade, o possuidor só terá efetivamente a propriedade se valendo da usucapião judicial (art. 1.238 a 1.244 do C.C/02 e usucapião extrajudicial (art. 216-A da Lei 6.015/1973). Nosso ordenamento jurídico possui 3 (três) ações possessórias existentes: Interdito Proibitório; Manutenção da Posse e Reintegração da Posse (arts. 554 a 568 do CPC/15). 

A posse seria o poder de fato e a propriedade, o poder de direito sobre a coisa...A posse é a porta que conduziria à propriedade, um meio que conduz a um fim, segundo Farias e Rosenvald. Ambos doutrinadores também citam Ihering onde afirma que a posse só se converte em direito, em homenagem ao direito superior de propriedade.

 

AFINAL, É NECESSÁRIO QUE SEJA FEITA A TENTATIVA DE USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL ANTES DE PODER INGRESSAR COM A USUCAPIÃO JUDICIAL? 

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o ajuizamento de ação de usucapião independe de pedido prévio na via extrajudicial. O relator do processo foi o ministro Villas Bôas Cueva. 

A decisão veio no julgamento de recurso especial interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) que, ao manter a sentença, entendeu que configura falta de interesse processual a proposição de ação de usucapião sem a demonstração de que tenha havido empecilho na via administrativa – posição alinhada ao Enunciado 108 do Centro de Estudos e Debates (Cedes-RJ), segundo o qual "a ação de usucapião é cabível somente quando houver óbice ao pedido na esfera extrajudicial". 

No STJ, a autora da ação sustentou que o acórdão violou o artigo 216-A da Lei 6.015/1973, o qual dispõe que, "sem prejuízo da via jurisdicional, é admitido o pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião, que será processado diretamente perante o cartório do registro de imóveis da comarca em que estiver situado o imóvel usucapiendo, a requerimento do interessado, representado por advogado".

 Lei é expressa quanto ao cabimento do pedido diretamente na via judicial 

Ao proferir seu voto, o ministro Villas Bôas Cueva destacou que a questão é definir se o artigo 216-A da Lei 6.015/1973 – com a redação dada pelo artigo 1.071 do Código de Processo Civil de 2015, que criou a figura da usucapião extrajudicial – passou a exigir, como pré-requisito para a propositura da ação judicial, o esgotamento da via administrativa.

Ele ressaltou que a Terceira Turma, no REsp 1.824.133, decidiu pela existência de interesse jurídico no ajuizamento direto da ação de usucapião, independentemente de prévio pedido extrajudicial. Naquele caso, o acórdão impugnado havia baseado sua decisão exatamente no Enunciado 108 do Cedes-RJ, mas a Terceira Turma entendeu que, apesar de louvável a intenção de desjudicialização de conflitos, não é possível relativizar a regra legal do caput do artigo 216-A da Lei 6.015/1973, que faz expressa ressalva quanto ao cabimento direto da via jurisdicional. 

"Nota-se que o novel procedimento extrajudicial foi disciplinado 'sem prejuízo da via jurisdicional', de modo que a conclusão das instâncias ordinárias – que entenderam necessário o esgotamento da via administrativa – está em confronto com a legislação de regência", concluiu Villas Bôas Cueva.

 

Leia o acórdão do REsp 1.796.394 


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