Inicialmente, cumpre ressaltar
que as criptomoedas nasceram após a criação do “Bitcoin”, em 2008.
Elas se utilizam da tecnologia “blockchain”,
um banco de dados enorme que registra todas as negociações dos usuários,
sendo os próprios participantes auditores da rede.
A grande diferença entre as
criptomoedas e os demais ativos financeiros é a negociação de pessoa para
pessoa, não necessitando, precipuamente, de um terceiro interventor como um
banco, uma fintech, uma corretora, etc.
Acontece que, apesar das
transações serem de pessoa para pessoa, os pequenos e médios investidores, em
sua grande maioria, adquirem criptomoedas por intermédio de corretoras, mais
conhecidas como “Exchange de Criptoativos”.
Aqui no Brasil, estas
corretoras devem ser registradas, além dos demais requisitos exigidos por
lei, na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), cumprindo todos requisitos da Lei
6.385/76, bem como as suas instruções normativas, em especial as exigências
de prevenção à lavagem de dinheiro (Instrução CVM 301) e a adequada
identificação do perfil do investidor (Instrução CVM 539).
Portanto,
o investidor deste ativo financeiro que opera em uma corretora regular aqui
no Brasil é plenamente identificado.
Sendo possível a identificação
do investidor de criptoativos em corretoras que operam regularmente no Brasil,
passemos a um outro questionamento: É possível penhorar
criptoativos, vez que são ativos financeiros com altíssima flutuabilidade e
passam à mingua dos requisitos de certeza, liquidez e exigibilidade?
Neste diapasão impende
colacionar o voto do e. Ministro Luiz Fux no ARE 1368409, que manteve a
recusa da Fazenda Estadual à oferta de criptomoedas pelo devedor que
postulava garantir o juízo e efetivar o parcelamento da dívida, verbis:
Relator(a): Min. PRESIDENTE
Decisão proferida pelo(a): Min. LUIZ FUX
Julgamento: 23/02/2022
Publicação: 24/02/2022
Decisão
DECISÃO: Trata-se de recurso extraordinário com agravo contra
decisão de inadmissão do recurso extraordinário. O apelo extremo foi
interposto com fundamento na alínea "a" do permissivo
constitucional. O acórdão recorrido ficou assim ementado: AGRAVO DE INSTRUMENTO
E AGRAVO INTERNO - Execução Fiscal
- Parcelamento - Garantia do Juízo - Viável a recusa da Fazenda Estadual aos
bens ofertados (“criptomoedas”), à
míngua dos requisitos de “certeza”, “liquidez” e “exigibilidade” - Suspensão do feito até
o julgamento, pelo C. Superior Tribunal de Justiça, do Tema n.º 769 -
Impossibilidade, à vista da ausência de determinação de constrição sobre o
faturamento - Penhora sobre recebíveis que foi objeto de outro agravo de
instrumento julgado por esta C. Câmara - Decisão mantida - Agravo de
instrumento desprovido - Prejudicado o agravo interno. Opostos os embargos de
declaração, foram rejeitados. No recurso extraordinário sustenta-se violação
do(s) art.(s) 5°, caput, XXXV, LV; 6°; 7°; 145, § 1°; 150, II, IV; 170 da
Constituição Federal. Decido. Analisados os autos, no que tange à alegação de
violação do(s) art(s). 5°, XXXV, LV da Constituição, verifica-se (...) (grifo
nosso)
De um lado, a Fazenda
Pública não vem aceitando criptoativos como fonte garantidora do juízo, o que
vem sendo corroborado pelos Tribunais em todas instâncias, por outro, os
magistrados e jurisprudência pátria vem mudando seu entendimento, deferindo o
bloqueio de criptoativos, principalmente quando já esgotados outros meios de
busca de bens do devedor, conforme acórdão da 7ª Turma Cível do TJDFT, verbis:
PROCESSO CIVIL. AGRAVO
DE INSTRUMENTO. PESQUISA. SISTEMA INFORMATIZADO. RENOVAÇÃO DE PESQUISAS EM
NOVO SISTEMA DE CONSULTA DE ATIVOS. SISBAJUD. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA
COOPERAÇÃO. DECISÃO REFORMADA.
1. Não obstante ser
obrigação do credor a indicação de bens do devedor passíveis de penhora, em
razão do princípio da cooperação entre as partes do processo, razoável o
deferimento das diligências necessárias para dar efetividade ao processo.
2. O acordo de
cooperação entre o Banco Central do Brasil, o Conselho Nacional de Justiça e
a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional proporcionou o desenvolvimento do
denominado Sistema de Buscas de Ativos do Poder Judiciário - SisbaJud,
disponível para utilização desde 8/9/2020. Tal ferramenta abarca as funcionalidades do antigo sistema BacenJud
e, ainda, viabiliza a requisição de informações detalhadas de extratos de
conta corrente; cópia de contratos de abertura de conta corrente e de contas
de investimentos; bloqueio de criptomoedas; cópia de fatura de cartões
de crédito; de extrato de câmbio; de cheques e de PIS e FGTS, por exemplo.
As inovações trazidas pelo sistema SisbaJud possibilitam acesso a informações
relativamente a entidades e operações financeiras não abrangidas pelo antigo
BacenJud, porquanto, relevante o requerimento após cerca de 01 ano após a
última consulta. 3. Recurso conhecido e provido. (grifo nosso)
(Acórdão 1396820, 07269370520218070000, Relator: LEILA ARLANCH,
7ª Turma Cível, data de julgamento: 2/2/2022, publicado no DJE:
4/3/2022. Pág.: Sem Página
Cadastrada.)
Ressalta-se que, na maioria das decisões deferindo a busca
e bloqueio de criptomoedas são condicionadas ao fornecimento, pelo autor, dos
endereços das corretoras conforme voto do i. desembargador da 4ª Turma
Cível do TJDFT, verbis:
07080771920228070000
Data: 21/03/2022
Órgão: 4ª Turma
Cível
Magistrado: JAMES
EDUARDO OLIVEIRA
Inteiro Teor:
(...)
1. Da petição de
ID115299924 Pugna a parte autora pela
expedição de ofício à Receita Federal, a fim de verificar a existência
de criptomoedas (bitcoins) pertencentes à executada para realização de
penhora, acaso existentes. Trata-se de ativo financeiro e com valor monetário
aferível, não havendo óbice à penhora desde que esteja sob custódia de alguma
corretora. Assim, defiro a penhora de eventuais criptomoedas pertencentes à
parte executada. No entanto, condiciono o cumprimento da diligência
ao fornecimento, pelo autor, dos endereços das corretoras a fim de expedir o
competente ofício, devendo juntar, ainda, a planilha atualizada do
débito. Prazo: 5 (cinco) dias. Vindo, expeçam-se os ofícios respectivos para
que informem a existência de criptomoedas em nome da parte executada e,
em havendo, bem como estando sob a custódia da corretora, fique ciente da
penhora deferida, não podendo o titular (parte executada) delas dispor sem
autorização deste Juízo.
(...) Intime-se
para resposta. Dê-se ciência ao Juízo da causa. Publique-se. Brasília-DF, 17
de março de 2022. JAMES EDUARDO OLIVEIRA-Relator
Confira essa decisão
denegatória da busca e penhora de criptoativos em caráter liminar, verbis:
07135317720228070000
Data: 10/05/2022
Órgão: 4ª Turma
Cível
Magistrado: FERNANDO
HABIBE
Inteiro Teor:
PODER JUDICIÁRIO DA UNIÃO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E
DOS TERRITÓRIOS AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) 0713531-77.2022.8.07.0000
AGRAVANTE: ITAU UNIBANCO S.A. AGRAVADO: CESAR AUGUSTO RAMOS ALCACIO, REDECOM
EMPREENDIMENTOS LTDA DECISÃO
1. O credor agrava da decisão da 2ª Vara de Execução de Títulos
Extrajudiciais e Conflitos Arbitrais de Brasília (Proc.
0735944-86.2019.8.07.0001 - id 119523767) que, em execução de cédula de
crédito bancário, indeferiu a penhora de eventuais criptomoedas a serem
localizadas mediante expedição de ofício às corretoras e entidades que as
administram, sob o fundamento de ausência de prova inequívoca de
possível relação dos executados com os ativos apontados, bem como suspendeu o
processo, na forma do CPC 921, III. Alega exigência de prova impossível, pois
somente terá acesso às informações mediante respaldo judicial, afirmando ser
evidente que o executado possui investimento em criptomoedas em razão de ele
e sua família serem ligados ao ramo de informática. Argumenta com a impossibilidade
de suspensão ex officio, sendo o
requerimento reservado ao integrante do polo ativo da execução. Aponta perigo
de dano na impossibilidade de obter a satisfação de seu crédito pelo prazo de
1 ano, comprometendo a execução. Requer o deferimento da medida. 2. Não há
risco de dano que justifique a liminar, que seria satisfativa, considerando a
possibilidade de o agravante requerer o desarquivamento do feito a qualquer
momento, encontrados bens penhoráveis (CPC 921, § 3º). Ademais, o CPC 921,
III, não condiciona a suspensão do processo a requerimento do exequente,
podendo o Juízo determiná-la ex officio. Indefiro a liminar pleiteada.
Informe-se ao Juízo a quo. Aos agravados, para contrarrazões. Intimem-se.
Brasília, 6 de maio de 2022. DESEMBARGADOR FERNANDO HABIBE Relator
Julgados utilizados como fonte neste estudo:
TJDFT: 07135317720228070000; 07132043520228070000;
07080771920228070000;07021974620228070000;07337140620218070000;
07253513020218070000;07063020320218070000
STJ: REsp 1885201 / SP; AgRg no HC 739123
STF: ARE 1368409
Anderson Siqueira Lourenço
17/07/2022
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário