Boa tarde! Conforme dito ontem hoje
vou falar sobre a “comissão de corretagem nos contratos de compra e venda de
unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária” e a jurisprudência do
Superior Tribunal de Justiça (STJ) neste sentido.
Ressalta-se que além do Código Civil
de 2002, julgados do STJ e STF utilizarei como base o Recurso Especial nº
1.599.511-SP, que teve como relator o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, e foi
paradigma em tese de Recursos Repetitivos sobre o tema.
Preliminarmente, importante consignar
que o contrato de corretagem foi regulado pelo Código Civil de 2002, tendo sido
estabelecida pelo legislador a sua definição, ipsi litteris:
Art. 722. Pelo contrato de
corretagem, uma pessoa, não ligada a outra em virtude de mandato, de prestação
de serviços ou por qualquer relação de dependência, obriga-se a obter para a
segunda um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas.
As regras acerca da comissão devida
ao corretor eis que se trata de um contrato oneroso estão no art. 724 e 725 do
mesmo códex:
Art. 724. A remuneração do
corretor, se não estiver fixada em lei, nem ajustada entre as partes, será
arbitrada segundo a natureza do negócio e os usos locais.
Art. 725. A remuneração é
devida ao corretor uma vez que tenha conseguido o resultado previsto no
contrato de mediação, ou ainda que este não se efetive em virtude de
arrependimento das partes.
A Lei que regula e disciplina a
profissão de Corretor de Imóveis é a 6.530/78,
e em seu artigo 3º preconiza que compete
ao Corretor de Imóveis exercer a intermediação na compra, venda, permuta e
locação de imóveis, podendo, ainda, opinar quanto à comercialização
imobiliária. Em seu parágrafo único explana que as atribuições constantes deste
artigo poderão ser exercidas, também, por pessoa jurídica inscrita nos termos
desta lei.
Ressalta-se que o contrato de
corretagem é estabelecido entre o incumbente (ou comitente) e o corretor (ou
empresa que atue no ramo de intermediação imobiliária), ao passo que o negócio
jurídico principal é celebrado entre o incumbente e o terceiro interessado na
realização do negócio.
Não há, portanto, relação contratual
direta entre o terceiro interessado no negócio e o corretor.
Desse modo, como não há relação
contratual direta entre o corretor e o terceiro, quem deve arcar, em regra, com
a remuneração do corretor é a pessoa com quem ele se vinculou, ou seja, o
incumbente.
Trata-se de simples aplicação do
princípio da relatividade dos efeitos dos contratos. Sobre o assunto, já se
manifestou o STJ e o Supremo Tribunal Federal em Recurso Extraordinário:
Respeitada a natureza do
contrato de corretagem, que pressupõe a obrigação de o corretor obter para o
incumbente determinado negócio (art. 722), desaparece toda dúvida acerca do
devedor da comissão: trata-se da pessoa que contratou o corretor. Ao propósito, assentou a 1ª Turma do STF:
"A comissão constitui obrigação a cargo de quem incumbe a realização da
corretagem. Via de regra, a comissão do corretor é devida pelo vendedor"
[STF, RE 77.800-RS, 1ª T, rel. Min. Djaci Falcão, 26.11.1973, DJU 17.05.1974,
p. 3.252] (grifo nosso). No mesmo sentido, a 4ª Turma do STJ proclamou o
seguinte: "Em princípio, quem responde pelo pagamento da comissão é aquele
que contratou o corretor, ou seja, o comitente". [STJ, REsp 188.324-BA, 4ª
T., rel. Min. Barros Monteiro, 07.03.2002, DJU 24.06.2002, p. 307].
Como a questão situa-se no plano do
Direito Privado, pode haver a transferência desse encargo, mediante cláusula
expressa no contrato principal, à outra parte interessada no negócio jurídico. O
passo seguinte é identificar quem é o incumbente no contrato de compra e venda
de imóvel: o comprador ou o vendedor?
Usualmente, na corretagem de imóveis,
o incumbente é o vendedor por ser a pessoa que coloca no mercado um bem imóvel
de sua propriedade.
Normalmente, quem solicita a
interferência do corretor é o vendedor do
imóvel e, ao fazê-lo, assume a obrigação pelo pagamento da corretagem. O Código
Civil em vigor não disciplina, de forma específica, a questão, sendo possível
entender, contudo e por lógica interpretação dos arts. 722 ss., caber tal
incumbência àquele que tenha contratado o corretor.
Conclui-se, assim, neste item, que,
no contrato tradicional de corretagem disciplinado pelo Código Civil, a
obrigação de pagar a comissão ao corretor é, em regra, do incumbente (ou
comitente), o qual, usualmente, no mercado imobiliário, é o vendedor, podendo,
entretanto, ser transferida a outra parte interessada no negócio mediante
cláusula contratual expressa no contrato principal.
Superados e esclarecidos os pontos acima passaremos a explicação da “corretagem na compra e venda de
unidades autônomas em incorporação imobiliária”.
A “corretagem na compra e venda de
unidades autônomas em incorporação imobiliária”, ou seja, de venda de imóveis
na planta, não fica mais sediado em um empresa de corretagem, mas, contratado
pela incorporadora, em estandes situados no próprio local da construção do
edifício de apartamentos.
Assim, o consumidor interessado se
dirige a um estande de vendas com o objetivo de comprar uma unidade autônoma de
um empreendimento imobiliário.
No estande, o consumidor é atendido
por um corretor previamente contratado pela incorporadora.
Alcançado êxito na intermediação, a incorporadora, ao celebrar o contrato
de promessa de compra e venda, transfere para o promitente-comprador a
obrigação de pagar a comissão de corretagem diretamente ao corretor, seja
mediante cláusula expressa no instrumento contratual, seja por pactuação verbal
ou mediante a celebração de um contrato autônomo entre o consumidor e o
corretor.
Esse cenário fático, aliás, é
condizente com o que foi apurado nas fiscalizações realizadas pela Receita
Federal do Brasil, conforme se constata na manifestação escrita da FAZENDA
NACIONAL, apresentada nos autos do REsp 1.551.591/SP, na condição de amicus curiae.
Esse quadro fático sintetiza a
prática usual do mercado imobiliário brasileiro da utilização da corretagem em
benefício do vendedor, pois toda a atividade desenvolvida, desde a divulgação
até à contratação, tem por objetivo angariar clientes para a incorporadora
(promitente-vendedora).
Finalmente, destaca-se a necessidade do conhecimento de clareza e
transparência na previsão contratual acerca da transferência para o comprador
ou promitente-comprador (consumidor) do dever de pagar a comissão de corretagem.
Para cumprir essa obrigação, deve a
incorporadora informar ao consumidor, até o momento celebração do contrato de
promessa de compra e venda, o preço total de aquisição da unidade imobiliária,
especificando o valor da comissão de corretagem, ainda que esta venha a ser
paga destacadamente.
Assim, o dever de informação,
princípio básico do Código de Defesa do Consumidor é cumprido quando este é
informado até o momento da celebração do contrato do que está pagando e suas
formas.
Nesse sentido, o STJ consolidou entendimento de que em regra a
incorporadora é que paga a comissão de corretagem, mas, esta pode transmitir o
ônus para o comprador desde que tenha
cláusula contratual expressa explicando o valor total da aquisição da unidade
autônoma, colocando em destaque o valor da comissão da corretagem, conforme
julgado abaixo:
RECURSO ESPECIAL
REPETITIVO. DIREITO CIVIL
E DO CONSUMIDOR. INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA. VENDA DE UNIDADES AUTÔNOMAS EM
ESTANDE DE VENDAS. CORRETAGEM. CLÁUSULA
DE TRANSFERÊNCIA DA
OBRIGAÇÃO AO CONSUMIDOR. VALIDADE.
PREÇO TOTAL. DEVER DE INFORMAÇÃO. SERVIÇO DE ASSESSORIA
TÉCNICO-IMOBILIÁRIA (SATI). ABUSIVIDADE DA COBRANÇA.
I - TESE
PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015: 1.1. Validade da cláusula contratual
que transfere ao
promitente-comprador a
obrigação de pagar
a comissão de
corretagem nos contratos de promessa de
compra e venda
de unidade autônoma
em regime de incorporação imobiliária,
desde que previamente informado o
preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque
do valor da comissão de corretagem (grifo nosso).
1.2. Abusividade da cobrança pelo
promitente-vendedor do serviço de assessoria
técnico-imobiliária (SATI), ou
atividade congênere, vinculado à
celebração de promessa de compra e venda de imóvel.
II - CASO
CONCRETO: 2.1. Improcedência do pedido de restituição da comissão de
corretagem, tendo em
vista a validade da cláusula prevista no
contrato acerca da
transferência desse encargo ao consumidor.
Aplicação da tese 1.1.
2.2. Abusividade da cobrança por serviço de
assessoria imobiliária, mantendo-se
a procedência do
pedido de restituição. Aplicação da tese
1.2.
III - RECURSO ESPECIAL
PARCIALMENTE PROVIDO.
(REsp 1599511/SP, Rel.
Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 24/08/2016, DJe
06/09/2016)
Concluindo o assunto há que se destacar
a diferença entre corretagem para venda e corretagem para compra.
Quando o
comprador vai ao mercado, pode ocorrer que seu interesse se dê por bem que está
sendo vendido já com a intervenção de corretor. Aí, inexistindo convenção das
partes, não lhe compete nenhuma obrigação quanto à comissão de corretagem, pois
o corretor já foi anteriormente contratado pelo vendedor.
Diferente é a hipótese em que o
comprador, visando à aquisição de bem, contrate o corretor para que, com base
em seu conhecimento de mercado, busque bem que lhe interesse.
Nessa situação, a tratativa inicial
com o corretor foi do próprio comprador.
Assim, caberá ao comprador pagar a
comissão de corretagem.
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