segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

Desapropriação Indireta – Culpa da Administração Pública – Força do artigo 1228, §5 e 6§ do Código Civil de 2002.



Desapropriação Indireta – Culpa da Administração Pública – Força do artigo 1228, §5 e 6§ do Código Civil de 2002.

REsp 1442440/AC, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/12/2017, DJe 15/02/2018
No caso em tela, o autor conseguiu ordem de reintegração de posse em 1991, mas encontra-se privado de suas terras há mais de duas décadas seja por ausência de força policial para o cumprimento do mandado reintegratório, seja em decorrência dos inúmeros incidentes processuais ocorridos nos autos ou em face da constante ocupação coletiva ocorrida na área, por milhares de famílias de baixa renda.
A 1ª Turma do STJ enfrentou diversas situações para alcançar a medida mais justa para todos, vejamos:
Constatada, no caso concreto, a impossibilidade de devolução da posse à proprietária, o Juiz de primeiro grau converteu, de ofício, a ação reintegratória em indenizatória (desapropriação indireta), determinando a emenda da inicial, a fim de promover a citação do Estado e do Município para apresentar contestação e, em consequência, incluí-los no polo passivo da demanda. E assim manteve o STJ Com fulcro no artigo 461, § 1º do CPC de 1973, em respeito ao princípio da celeridade e da economia processual, ipsis litteris:

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.          
§ 1o A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.
Com fulcro no artigo 499, do nóvel CPC/15, ipsis litteris:

Art. 497.  Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.
...
Art. 499.  A obrigação somente será convertida em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.

Não há se falar em violação ao princípio da congruência, devendo ser aplicada à espécie a teoria da substanciação, segundo a qual apenas os fatos vinculam o julgador, que poderá atribuir-lhes a qualificação jurídica que entender adequada ao acolhimento ou à rejeição do pedido, como fulcro nos brocardos iura novit curia e mihi factum dabo tibi ius e no art. 462 do CPC/1973
A conversão operada na espécie não configura julgamento ultra petita ou extra petita, ainda que não haja pedido explícito nesse sentido, diante da impossibilidade de devolução da posse à autora.
Princípio da Congruência ou adstrição

 Art. 492. Do CPC 2015 - É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.
Parágrafo único.  A decisão deve ser certa, ainda que resolva relação jurídica condicional.

Não poderá o juiz conceder nada a mais (ultra petita) ou diferente do que foi pedido (extra petita).

Assim, como não poderá fundamentar-se em causa de pedir diferente da narrada pelo autor; caso não seja observado esse princípio a sentença será considerada nula.

Exceções previstas em Lei ao Princípio da Congruência:

1) Pedidos implícitos: o magistrado poderá conceder o que não foi demando pelo autor.

2) Fungibilidade: o magistrado poderá conceder tutela diferente da requerida nas ações possessórias e cautelares, como no caso em tela.

3) Demandas cujo objetivo é uma obrigação de fazer ou não fazer: o magistrado poderá conceder tutela diversa.

4) O Supremo Tribunal Federal também admite o afastamento do princípio da congruência ao declarar inconstitucionalidade de uma norma, em atenção a pedido formulado pelo autor, todavia, utilizando-se de fundamentos diferentes daqueles que foram suscitados.
Teoria da substanciação 

A teoria da Substanciação da Causa de Pedir foi adotada pelo direito processual brasileiro. Ela exige os fatos e os fundamentos jurídicos como elementos da causa de pedir.

Essa teoria, pressupõem que o magistrado conhece o direito sendo mais  importante uma discrição fática correta, tendo em vista, que o juiz irá decidir sobre o direito posto.

Assim sendo, a fundamentação legal apresentada pelo autor não vincula o juiz, que poderá tomar a decisão através de sua livre convicção jurídica sobre o caso apresentado pelo autor.

A Teoria da Substanciação é uma aplicação alternativa a Teoria da Individuação. Nessa, não há o requisito da causa de pedir remota, ou seja, não requer os fatos, só necessita da apresentação dos fundamentos jurídicos do pedido. Essa doutrina não é aplicada no Brasil.
No caso em tela, a narração fática foi crucial para o Juiz da causa analisar e vislumbrar a impossibilidade da reintegração, e, ao mesmo tempo a desídia do Estado e Município, convertendo a ação de reintegração de posse em perdas e danos pela desapropriação indireta utilizando a Teoria da Substanciação junto aos brocardos iura novit curia (Juiz conhece a norma jurídica e a aplica conforme seu entendimento) e mihi factum dabo tibi ius (Me dá os fatos que eu te darei o Direito).

In casu,  a lide foi analisada à luz do disposto no art. 1.228, §§ 4º e 5º, do CC/2002, que trata da desapropriação judicial, chamada também por alguns doutrinadores de desapropriação por posse-trabalho ou de desapropriação judicial indireta, cujo instituto autoriza o magistrado, sem intervenção prévia de outros Poderes, a declarar a perda do imóvel reivindicado pelo particular em favor de considerável número de pessoas que, na posse ininterrupta de extensa área, por mais de cinco anos, houverem realizado obras e serviços de interesse social e econômico relevante, ipsis litteris:
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
§ 4o O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante.
§ 5o No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores.

Assim, os conceitos abertos existentes no art. 1.228 do CC/2002 propiciam ao magistrado uma margem considerável de discricionariedade ao analisar os requisitos para a aplicação do referido instituto, de modo que a inversão do julgado, no ponto, demandaria o reexame do conjunto fático-probatório, providência vedada no âmbito do recurso especial, em face do óbice da Súmula 7 do STJ.
Ressalta-se que inexiste desapossamento por parte do ente público ao realizar obras de infraestrutura em imóvel cuja invasão já se consolidara, pois a simples invasão de propriedade urbana por terceiros, mesmo sem ser repelida pelo Poder Público, não constitui desapropriação indireta.

 Porém, neste caso o Juiz e magistrados não tiveram dúvidas de que os danos causados à proprietária do imóvel decorreram de atos omissivos e comissivos do Poder Público tendo em conta que deixou de fornecer a força policial necessária para o cumprimento do mandado reintegratório, ainda na fase inicial da invasão, permanecendo omissa quanto ao surgimento de novas habitações irregulares, além de ter realizado obras de infraestrutura no local, com o objetivo de garantir a função social da propriedade, circunstâncias que ocasionaram o desenvolvimento urbano da área e a desapropriação direta de parte do bem. 
A solução da controvérsia exigiu a consideração dos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da segurança jurídica, em face das situações jurídicas já consolidadas no tempo, de modo a não piorar uma situação em relação à qual se busca a pacificação social, visto que "é fato público e notório que a área sob julgamento, atualmente, corresponde a pelo menos quatro bairros da cidade de Rio Branco, onde vivem milhares de famílias, as quais concedem função social às terras em litígio, exercendo seu direito fundamental social à moradia".

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