Desapropriação
Indireta – Culpa da Administração Pública – Força do artigo 1228, §5 e 6§ do
Código Civil de 2002.
REsp 1442440/AC,
Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/12/2017, DJe
15/02/2018
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No caso em tela, o
autor conseguiu ordem de reintegração de posse em 1991, mas encontra-se
privado de suas terras há mais de duas décadas seja por ausência de força
policial para o cumprimento do mandado reintegratório, seja em decorrência
dos inúmeros incidentes processuais ocorridos nos autos ou em face da
constante ocupação coletiva ocorrida na área, por milhares de famílias de
baixa renda.
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A 1ª Turma do STJ enfrentou diversas situações para
alcançar a medida mais justa para todos, vejamos:
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Constatada,
no caso concreto, a impossibilidade de devolução da posse à proprietária, o
Juiz de primeiro grau converteu, de ofício, a ação reintegratória em
indenizatória (desapropriação indireta), determinando a emenda da inicial, a
fim de promover a citação do Estado e do Município para apresentar
contestação e, em consequência, incluí-los no polo passivo da demanda. E
assim manteve o STJ Com fulcro no artigo 461, § 1º do CPC de 1973, em respeito ao princípio da celeridade
e da economia processual, ipsis
litteris:
Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento
de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da
obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem
o resultado prático equivalente ao do adimplemento.
§ 1o A obrigação somente se converterá em perdas e
danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a
obtenção do resultado prático correspondente.
Com fulcro no
artigo 499, do nóvel CPC/15, ipsis
litteris:
Art. 497. Na
ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se
procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará
providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático
equivalente.
...
Art. 499. A
obrigação somente será convertida em perdas e danos se o autor o requerer ou
se impossível a tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado
prático equivalente.
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Não há se falar em
violação ao princípio da congruência, devendo ser aplicada à espécie a teoria
da substanciação, segundo a qual apenas os fatos vinculam o julgador, que
poderá atribuir-lhes a qualificação jurídica que entender adequada ao
acolhimento ou à rejeição do pedido, como fulcro nos brocardos iura novit
curia e mihi factum dabo tibi ius e no art. 462 do CPC/1973
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A conversão operada na espécie não
configura julgamento ultra petita ou extra petita, ainda que não haja pedido
explícito nesse sentido, diante da impossibilidade de devolução da posse à
autora.
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Princípio da Congruência ou adstrição
Art. 492. Do CPC 2015 - É vedado ao juiz
proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em
quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.
Parágrafo
único. A decisão deve ser certa, ainda
que resolva relação jurídica condicional.
Não poderá o juiz
conceder nada a mais (ultra petita)
ou diferente do que foi pedido (extra
petita).
Assim, como não
poderá fundamentar-se em causa de pedir diferente da narrada pelo autor; caso
não seja observado esse princípio a sentença será considerada nula.
Exceções previstas em Lei ao Princípio da
Congruência:
1) Pedidos
implícitos: o magistrado poderá conceder o que não foi demando pelo autor.
2) Fungibilidade:
o magistrado poderá conceder tutela diferente da requerida nas ações
possessórias e cautelares, como no caso em tela.
3) Demandas cujo
objetivo é uma obrigação de fazer ou não fazer: o magistrado poderá conceder
tutela diversa.
4) O Supremo
Tribunal Federal também admite o afastamento do princípio da congruência ao
declarar inconstitucionalidade de uma norma, em atenção a pedido formulado
pelo autor, todavia, utilizando-se de fundamentos diferentes daqueles que
foram suscitados.
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Teoria da substanciação
A teoria da
Substanciação da Causa de Pedir foi adotada pelo direito processual
brasileiro. Ela exige os fatos e os fundamentos jurídicos como elementos da
causa de pedir.
Essa teoria,
pressupõem que o magistrado conhece o direito sendo mais importante uma discrição fática correta,
tendo em vista, que o juiz irá decidir sobre o direito posto.
Assim sendo, a
fundamentação legal apresentada pelo autor não vincula o juiz, que poderá
tomar a decisão através de sua livre convicção jurídica sobre o caso
apresentado pelo autor.
A Teoria da
Substanciação é uma aplicação alternativa a Teoria da Individuação. Nessa,
não há o requisito da causa de pedir remota, ou seja, não requer os fatos, só
necessita da apresentação dos fundamentos jurídicos do pedido. Essa doutrina
não é aplicada no Brasil.
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No caso em tela, a
narração fática foi crucial para o Juiz da causa analisar e vislumbrar a
impossibilidade da reintegração, e, ao mesmo tempo a desídia do Estado e
Município, convertendo a ação de reintegração de posse em perdas e danos pela
desapropriação indireta utilizando a Teoria
da Substanciação junto aos brocardos iura novit curia (Juiz conhece a
norma jurídica e a aplica conforme seu entendimento) e mihi factum dabo tibi ius (Me dá os fatos que eu te darei o
Direito).
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In casu, a lide foi analisada à luz do disposto no
art. 1.228, §§ 4º e 5º, do CC/2002, que trata da desapropriação judicial,
chamada também por alguns doutrinadores de desapropriação por posse-trabalho
ou de desapropriação judicial indireta, cujo instituto autoriza o magistrado,
sem intervenção prévia de outros Poderes, a declarar a perda do imóvel
reivindicado pelo particular em favor de considerável número de pessoas que,
na posse ininterrupta de extensa área, por mais de cinco anos, houverem
realizado obras e serviços de interesse social e econômico relevante, ipsis litteris:
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar,
gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que
injustamente a possua ou detenha.
§ 4o O proprietário também pode ser privado da coisa
se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e
de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas
nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços
considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante.
§ 5o No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará
a justa indenização devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença
como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores.
Assim, os
conceitos abertos existentes no art. 1.228 do CC/2002 propiciam ao magistrado
uma margem considerável de discricionariedade ao analisar os requisitos para
a aplicação do referido instituto, de modo que a inversão do julgado, no
ponto, demandaria o reexame do conjunto fático-probatório, providência vedada
no âmbito do recurso especial, em face do óbice da Súmula 7 do STJ.
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Ressalta-se que inexiste
desapossamento por parte do ente público ao realizar obras de infraestrutura
em imóvel cuja invasão já se consolidara, pois a simples invasão de propriedade
urbana por terceiros, mesmo sem ser repelida pelo Poder Público, não constitui
desapropriação indireta.
Porém, neste caso o Juiz e magistrados não
tiveram dúvidas de que os danos causados à proprietária do imóvel decorreram
de atos omissivos e comissivos do Poder Público tendo em conta que deixou de
fornecer a força policial necessária para o cumprimento do mandado
reintegratório, ainda na fase inicial da invasão, permanecendo omissa quanto
ao surgimento de novas habitações irregulares, além de ter realizado obras de
infraestrutura no local, com o objetivo de garantir a função social da
propriedade, circunstâncias que ocasionaram o desenvolvimento urbano da área
e a desapropriação direta de parte do bem.
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A solução da
controvérsia exigiu a consideração dos princípios
da proporcionalidade, da razoabilidade e da segurança jurídica, em face das
situações jurídicas já consolidadas no tempo, de modo a não piorar uma
situação em relação à qual se busca a pacificação social, visto que "é
fato público e notório que a área sob julgamento, atualmente, corresponde a
pelo menos quatro bairros da cidade de Rio Branco, onde vivem milhares de
famílias, as quais concedem função social às terras em litígio, exercendo seu
direito fundamental social à moradia".
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